Alguém sugere um título?

toda tristeza do mundo

é só sua – e de mais ninguém

quando é impossível

explicar o que é

ou o que causa

essa tal tristeza aguda

 

nem o amor te segura

nem o relógio te alcança

é preciso alimentar a alma

 

nas ruas as sirenes não mentem:

dois carros se acham no choque

dois corpos lamentam no chão

e aqui dentro nada disso importa

ao motorista resta abrir a porta

mas o poeta já não tem portão

 

por isso chorar é pouco

mentir é pouco

pecar é pouco para redimir

– matar seria pouco para viver –

pecar é pouco para o perdão

errar é entrelaçar o dito com o não dito

e repito: nem sei mais o que disse.

 

porque toda tristeza do mundo

é essa que habita a incompreensão

 

nada no mundo perdoa

o relógio te segura o pescoço

é preciso sempre alimentar a alma

 

nas ruas o frio assola o sono de quem não dorme

e dormir parece bom

porque logo tem de acordar

para logo voltar a dormir

ou enlouquecer a pensar por aí

até o dia te pedir em casamento

e debaixo de lua enevoada

te deitar na cama

 

no escuro os sonhos são lindos

até queremos sonhar mais no claro

a clarividência de ver luz no túnel do fim

ou será que só o poeta é assim?

 

toda tristeza do mundo

tá na lágrima da família dos acidentados

e também aqui no meu peito

na impossibilidade por baixo da cobrança

e em cada solitário diante do inconfessável

inexprimível sentir doente

que se sente

mas mal se sabe o que é

 

nem o amor te ajuda

nem o relógio te impede

só a alma te alimenta:

 

e você sem fome.