Todavia

Todavia é expressa

Porém que é pior

Posto que passei direto

Na curva do retorno

À sobriedade

 

E perdi meu sentido

Capotando polissêmicas vezes...

Depois rodando na ânsia

De nunca mais

Ser depois

 

Entre um giro e um giro outro

Outro giro e o grito solto

Cavalinho de pau na retórica

Já que dividi a frase

Em mão                      >

               -

<                  dupla

 

Toda

        Via

             é pressa

 

Todavia,

Ninguém merece apreço

Sem pagar o preço

Pelo rodopiar

Em letras.

Cadeiras ao par

No meu quintal

existem duas cadeiras

 

Confortáveis

 

Por cima delas

fiz questão de mandar

que construíssem o céu

 

Já que sou milionério

- por parte de natureza -

fiz um veu infinito

e nele, infinitos pontos

 

Luminosos

 

Só existe uma, uma só

que me faz companhia

e juntos, o impossível

no milímitro do viável

 

Cadeiras acoplada ao par

infinito divido à dois:

 

Infinito

 

No meu quintal

existem dois infinitos

 

Um sou eu

Outro também.

 

Texto bem velho. Talvez de junho do ano passado, mas enfim, tá aí só porque o achei, impresso aqui, perdido pelo chão. Obrigado pelas visitas. É um prazer. Paz.

Tanto Faz

um infinito de porquês eternos

poderíamos arrotar durante horas

argumentando o que não tem porquê

 

ou catando razões no paliteiro

para tirar dos dentes aquelas verdades incômodas

 

falamos na língua mais presa

e os pés medem o mesmo tamanho

somos quase iguais e quase somos nós

 

no limite do sucesso particular

e na beira do abismo psicológico

entre o que todo mundo é

e o que esse mesmo todo mundo condena ser

 

a loucura bate na porta

mendiga porquês

 

ignorar é um bom passo

mas daqui a pouco nem pão

nem mão, a desigualdade te toma o braço

 

e nessa brincadeira, quem é você?

e quem sou eu, nessa encruzilhada para ratos?

 

a resposta mais coerente me parece ser: tanto faz.

Poesia da Gota

 

há pouco, tava no hospital

mas no caminho me perdi de leve

e me peguei com quatro discos de vinil

entrando pela portaria feito um dj

 

luiz gonzaga jr. deu bom dia às 22h

joão com caetano e gilbertino bethânico

e tinha dois do moraes

 

os discos têm retratos que riem da gente

eu sem uma vitrola de bolso sequer

lia encartes e imaginava melodias

 

agora já em casa, alimentado e dormido

me falta um benjamim pra bifurcar a tomada

da pick-up-fusca e do amplificador solene

 

quem me traz? ninguém.

mas e daí? a poesia vem.

e sem medo de escândalo.

Como Só Ela

quando vejo um negro

preto como a noite

sorriso enluarado

sinto um orgulho armado

e tudo que queria

era ser você

de chinelo de palha

mascando cana

 

e namorar as negras

tão pretas que somem

na madrugada

e só se acham

em nossos braços

porque são lindas mulatas

 

porque a raça é

bela como nunca

 

e forte como só

     ela

 

resistente como só ela

como só ela é

 

ela é a raça

do povo de Deus

 

caboclo do breu

em brasa

cor preta,

          teamo!

<==>Shuffle<==>

a vida é shuffle

aleatória

e sem história

anti-presença

de cadência

e harmonia

 

um rit

um samba

sample, sampa

maracatu

atômico

ou atônito

 

rock

clássico

pop popup

ídolo de barro

anarquia

culta

não há

 

aleatoriamente:

olhos de moraliza

orelha de

Van Gogh

pés de Tarsila

 

shuffle de vida

sem porque

porque o programa

é esse.

 

cinco mil obras

shuffle

e nenhum sentido.

 

a não ser

é claro

o próprio sentido

do shuffle

 

que é optar

sem ser optativo

e ser alguém

mesmo sem ser ativo

 

salada de obra

arte na veia

veia de obra

de arte

 

arte da repetição

arte contra-mão da arte

arte shuffle.

 

viva [com alto teor de deboche]

o mundo shuffilizado!

Violentar a Rima

Me foge o tempo

Me escapa, sem pudor, as idéias

O raciocínio camuflado

Emerge na rotina castigada

Do caçador de poesias

 

Vasculhando cada gaveta de memória

Cada vestígio que me leve à pistas

E acabo de descobrir o nocivo tema

 

Acuso em versos à escassez dos versos

E grito o verbo que me torna o avesso

Devasso, confesso

Julgado e condenado por violentar a rima.

 

Mais um das antigas. Lá pelo ano de 2006.

Muito obrigado pela sua visita.

Vai Vai

eu me sinto um pianista

escrevendo poesia

num teclado macio

 

e de fato

faço música

no verbo

 

vai

     vai

 

vai-vai

A Vida A Vida A Vida

a vida pequena no dia a dia

curta nas vinte e quatro horas e meia

meio mole é a vida na esquina sem luz

 

a vida curtinha do jardim da infância

e a infâmia da vida sem lei, o meu rei

na madrugada da vida na via sem encosto

 

o acostamento do desgosto a vida tem

e no posto da esperança fiz acampamento

a vida era cimento lá dentro de mim

 

no fundo do mundo a vida escorrendo

do prato sem fundo ou do mudo que abala

a vida se cala na fala do coro e desencoraja

Uma Parte

Uma parte que me deixa à parte

Ninguém curte

Unicamente surto

Pelo vão, pela via

Pedaço, de extrema ungia

 

Nem costas, nem seio

Sem nomes, batizo

Nem seio, nem costas

Sem afetos, consigo-os

 

Nem meio, nem lastro

Tão quanto embaixo

Nem lastro, nem ponta

Nem meio

Toda corja de cortejos

Sejam cortados.

 

Mas me deixa torto e tonto

Essa parte inominável

Que delega o denso nível

Do pedaço admirável

Centímetros quadrados

Em desejos redondos

Um milésimo, irrecusável

 

Nem nada, nem tudo

Tudo...

...nada é meu tudo de nada

Nada posso...

Além de sonhar:

Sonho...

 

Nem costas, nem seio

Tão quanto me caço

Nem seio, nem costas

Sensível abraço

Só o que posso

E assim mereço

Tocar-te...

 

Te tocar mais calmo

Te falar com medo

Que entre costa e seio

Nada mais é tudo

Apenas um receio

De tocar-lhe o meio

 

Entre o céu e o mar

Num pedaço inalcançável

Feito o horizonte.

 

Texto antigo. De Julho do ano passado. Mas afinal, recordar...

Obrigado pela visita. Volte sempre.